Há meses eu venho programando uma viagem à praia. Sabe aquela de mar azul, meio isolada e, é claro, com hotel pé na areia? Pois é, essa viagem estava reservada para a semana passada, mas tive um desafeto com meu amigo clima e ela não foi permitida, rs.
O tempo estava nublando e para boa parte dos dias a previsão era de chuva. E todos sabem: praia e chuva não combinam. Resolvi cancelar as diárias do hotel e pedir o reembolso. Contei essa história para explicar o tema desse artigo: a contabilidade mental. Mas o que tem a ver a areia da praia com essas contas que nossa cabeça faz?
Afinal, o que é essa tal de contabilidade mental?
A contabilidade mental é um viés cognitivo que nos facilita tomar decisões financeiras, boas ou ruins, que geralmente não são totalmente racionais. É como se a nossa cabeça tivesse diversas contas para depositar o nosso dinheiro. Por exemplo, a conta do financiamento, das despesas da casa, das férias, da viagem do intercâmbio e por aí vai…
O ser humano, desde os nossos ancestrais, tem em seu DNA as células do imediatismo e prefere viver o agora, não pensa muito no depois. Aqui, faço uma alusão àquela música “Tão Seu“, do Skank, e ao artigo Dinheiro agora ou depois? A importância de pensar no futuro, escrito pelo Evandro Mello, fundador da Multiplicando Sonhos, em sua coluna no E-Investidor. Ambos refletem sobre esse tema: o presente e o imediatismo.
Pensar no futuro pode ser incômodo e dar muito trabalho. Afinal, ter que planejar sua vida daqui 20, 30 ou 40 anos não é das tarefas mais simples, já que, geralmente, não costumamos pensar nem no que vamos almoçar, não é mesmo?!
“O futuro está longe e não pertence a nós”. Opa, espera! Não é bem assim! O futuro chega, pertence a nós, e nos planejar é fundamental para vivermos da forma que queremos lá na frente, principalmente quando se trata de finanças. Quanto mais cedo tomarmos decisões conscientes, mais cedo alcançaremos nossos objetivos.
Planejamento é fundamental!
Voltando à areia branca e ao mar azul… A viagem não aconteceu, mas as diárias já estavam pagas e, por isso, solicitei o cancelamento. O hotel devolveu o dinheiro por meio de um crédito na fatura do cartão de crédito. Na hora, fiquei super feliz com o estorno, esqueci até do pé na areia e do café da manhã do sonhos do hotel. Meu pensamento era só um: onde vou torrar todo esse dinheirão?
Você se sentiria da mesma forma? Esse dinheiro “ganho” na sua conta faria você se sentir que ganhou na loteria e sairia por aí esbanjando?
Assim como eu, a maioria de vocês responderia sim! Nosso cérebro contabiliza esse dinheiro de uma forma diferente e nos engana. Ele nos faz pensar que o dinheiro pago pelas diárias, suado com o esforço do meu trabalho meses atrás, é diferente do dinheiro que recebi agora como estorno pelas diárias canceladas. Essa contabilização do mesmo valor do dinheiro de formas diferentes é a contabilidade mental. Nosso cérebro carimba esse dinheiro como “prêmio”, mas na verdade isso pode ser uma grande cilada.
Conta mental
Como disse, essa diferenciação do dinheiro, que só existe na nossa cabeça, pode nos levar a tomar decisões um tanto quanto perigosas.
Imagine que você tem dinheiro guardado na poupança. Para o seu cérebro, essa “conta mental” da poupança é “sagrada” e não pode ser mexida.
Agora imagine que você teve uma emergência e precisou de dinheiro para um socorro médico. Eu pergunto a você:
1- Você recorre ao cheque especial?
ou
2- ao dinheiro “sagrado” da poupança?
Muitos de nós, e eu também me incluo nessa, responderia prontamente que sim à pergunta de número 1. Passaria o cartão sem pensar muito. Afinal de contas, se as coisas já estão complicadas com a saúde, mexer no que é “sagrado” pode piorar ainda mais, não é mesmo?!
NADA DISSO! O dinheiro da poupança e do cheque especial é o mesmo. Porém, o do banco virá acrescido de juros altos e complicará ainda mais seu orçamento. Nesse caso, mexer no dinheiro da poupança é a melhor opção.
Podemos até nos sentir “pecadores” mexendo em dinheiro sagrado, mas essa sensação de contravenção é responsabilidade do viés da contabilidade mental, e conhecê-lo nos ajudará a tomar decisões mais conscientes a favor do nosso rico dinheirinho.
Dicas
Como essa tal contabilidade mental nos prega um monte de peça, listei algumas dicas para você ficar de olho e ver se não está pecando nessas contas mentais:
- Dinheiro “suado e dinheiro “ganho” é tudo dinheiro, não devem ser tratados de formas diferentes. Use sempre com muita responsabilidade;
- Contas mentais “sagradas” devem ser mexidas em caso de necessidade e de oportunidades de obter melhores rendimentos. Em vez de deixar aquele dinheiro na poupança, por que não avaliar outros investimentos que podem dar melhor remuneração?
- Adquira o hábito de registrar as despesas, e não fique com os gastos somente na cabeça. Isso nos permite consumir sem perceber e gastar e sem muito critério. O costume de colocar no papel facilita você ser mais racional nas suas escolhas e, consequentemente, economizar;
- Cogite renegociar as despesas e dívidas por taxas menores. Não se acostume com os valores pagos mensalmente. Acredite: muitas vezes, a anuidade do cartão de crédito pode ser negociada ou até mesmo isentada e o plano de celular, por exemplo, pode ser alterado para um mais em conta. As despesas vão sendo pagas no automático, mas lembrar de dar uma revisada periodicamente pode garantir uma boa economia;
- Contabilize seu salário pelo valor líquido, eliminando os impostos e demais descontos. Se você planejar seu orçamento pelo valor bruto, você gastará mais do que ganha e não conseguirá organizar suas contas nunca!
- Não deixe a “vida te levar”. Por mais que alguns prazos possam parecer distantes, tente resolver o quanto antes. Assim, quando o prazo estiver acabando, você já vai ter concluído. Isso vale tanto para tarefas de escola, como para a aposentadoria. Quem nunca deixou para a última hora e acabou se arriscando a entregar um trabalho com a qualidade menor do que esperava? Ou deixou para pensar na aposentadoria quase chegando na melhor idade? Não deixe para amanhã o que você pode começar hoje!
- Por fim, não confie na sua cabeça! Planeje, análise e revise suas contas periodicamente. Veja se pode cortar os supérfluos, análise e renegocie suas despesas, avalie seus investimentos e se pode realocar em opções mais atrativas.
E agora, deixa eu curtir minha praia, porque decidi pegar o meu dinheiro “ganho” e investir em outra estadia, só que dessa vez no Nordeste, porque aqui é sol o ano inteiro.
E você, faça suas contas! Às vezes, as que estão na nossa cabeça não estão tão certas como acreditamos!
Texto: Andrea Tavares
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Leia nosso último post: http://www.multiplicandosonhos.org/2021/11/30/organize-a-sua-grana-e-aprenda-a-stalkear-o-dinheiro/